quinta-feira, 12 de março de 2009

Ensino. Realidade aponta falhas no modelo de educação inclusiva adotado nas escolas do sistema público

Inclusão improvisada, alunos com deficiência abandonados
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Crianças portadoras de necessidades especiais não têm atenção adequada

Flávia Martins Y Miguel
Jornal O Tempo

No plano das ideias, dos discursos de gestores e principalmente no papel, a inclusão dos alunos com deficiência no sistema público de ensino é uma política impecável. Na prática, porém, o modelo de educação especial inclusiva desenhado com régua e compasso pelo Ministério da Educação (MEC) em 2003 apresenta obstáculos enormes, que passam pelo despreparo dos professores, falta de acessibilidade nas escolas e nenhum projeto pedagógico específico. O resultado dessas distorções pode ser facilmente identificado dentro das salas de aula. Como é o caso da pequena Jordânia Sarafim, 12, que nasceu com paralisia cerebral e está matriculada em uma escola pública no bairro Novo Progresso, em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte. A mãe, Maria Solidade Silva, se viu obrigada a assistir às aulas ao lado da filha para tentar driblar a falta de atenção dada à aprendizagem da criança. "Eles nos obrigam a colocar as crianças na escola regular, mas os professores não sabem educar, não têm os cursos para isso. Eu fico muito desmotivada.
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Não quero que ela fique largada. Eu quero que ela aprenda. A minha menina é uma gracinha, ela tem potencial", desabafou Maria. Na sala ao lado de Jordânia, um garotinho com má formação física e deficiência visual estava sentado em cima de uma almofada, a poucos centímetros da lousa, copiando as palavras. A professora contou que o pequeno de 11 anos, com estatura de uma criança de 6, chegou de casa chorando naquele dia. O motivo: ele não sabia ler. "Temos alunos que precisam de um trabalho diferenciado. Não temos orientação nenhuma de como tratar as várias deficiências que temos nessa escola. Ninguém aqui nunca teve preparo para isso", disse Gorete Foscolo, supervisora da escola municipal. É na boa vontade dos profissionais e na sorte que a política de inclusão tenta se equilibrar, enquanto as ações dos gestores não se mostram eficazes. Em Contagem, são 1.400 alunos com deficiências variadas na rede pública, de um total de 81 mil estudantes. No entanto, a Secretaria Municipal de Educação e Cultura não soube informar quantos dos mais de 4.200 professores do município foram capacitados para trabalhar com a educação especial. O secretário da pasta, Lindomar Diamantino Segundo, admitiu que a inclusão está longe do ideal. De acordo com ele, o tema é um desafio para a sociedade.
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"A escola brasileira, na sua história, não foi pensada para incluir. Mas já fizemos investimentos na formação dos professores, com vários cursos de inclusão. A nossa obrigação é sempre melhorar", disse. O garoto Luiz Felipe Wenceslau, 7, portador de paralisa cerebral, contou com o privilégio de ter passado pelas mãos de uma psicopedagoga, em uma escola pública no bairro Inconfidentes, em Contagem, no ano passado. Mesmo assim, a mãe teve que batalhar pela presença de um auxiliar em sala de aula para cuidar do filho. "Sem estagiário, a professora tinha que deixar as 25 crianças para trocar a fralda dele. E ainda tive sorte porque ela tinha experiência na área", disse a comerciante Deyse Wenceslau. A professora do menino, Maria Eugênia Aleixo, relembrou com carinho da experiência de ensinar o aluno especial. Porém, disse que são poucos os colegas que conseguem sucesso. "Luiz Felipe foi um privilégio. Mas ainda acho que a lei no papel é uma coisa e no cotidiano da escola, o que se vê são alunos matando o tempo. Tudo é tratado como formalidade para matar o tempo."
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Censo Escolar
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Mudanças. Em 2004, passaram a ser coletados os dados sobre a série ou o ciclo escolar dos alunos atendidos pela educação especial, possibilitando a criação de indicadores sobre a qualidade da educação no país.
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Publicado em: 08/03/2009
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